Milhões de paulistanos dependem do transporte público.
Precisam encarar a lata de sardinha humana que é o Metrô e os trens da CPTM.
Usuários de ônibus, se é que se pode dizer, sofrem mais. Além da superlotação,
o trânsito caótico da cidade prolonga as horas de sofrimento na ida para o
trabalho e na volta para casa.
Estima-se que 6 milhões de usuários sejam transportados de
ônibus diariamente em São Paulo. A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
(CPTM) transporta cerca de 3 milhões de pessoas diariamente. Já o Metrô
paulistano transporta cerca de 4,5 milhões de usuários por dia.
Faça as contas: essa quantidade de pessoas pagando 3 reais
diariamente (supondo somente a ida) dá uns 40,5 milhões de reais POR DIA de
faturamento para as empresas de transporte. Por mês da aproximadamente... bom,
dá dinheiro para caralho.
É normal nos questionarmos se esse valor não pode ser
revertido em melhoras para o sistema de transporte público da maior cidade do
país.
Foquei em São Paulo, pois se a maior cidade do País que é a
7º maior economia do mundo tem problemas tão básicos, o que dirão os usuários
das demais cidades. O fato é que a má qualidade do transporte público não está
restrita as metrópoles, mas nas metrópoles é que são evidenciadas as causas.
Quem nunca se perguntou: por que permitir esse trânsito
quando se pode investir no transporte público? Por que as constantes
“melhorias” e “reformas” nas linhas de metrô e trem não resolvem o problema de
superlotação? Por que tudo que é arrecadado não é de fato usado para resolver o
problema, apenas para maquiá-lo como se houvesse uma tentativa de resolução?
A resposta para todas essas questões pode ser resumida
respondendo outra pergunta.
Por que é interessante que o transporte público não seja bom?
- Essa, caro leitor, é a pergunta correta.
As empreiteiras justificam que estão fazendo melhorias. A
nova linha Amarela do Metrô paulista, os (poucos) trens novos que chegaram com
ar-condicionado (um luxo desnecessário em um país tropical, imagino) e a nova
frota de ônibus da Sptrans (foram trocados, mas não aumentaram
significativamente em quantidade).
Imagino que não sou o único a acreditar que com 40,5 MILHÕES
de reais POR DIA, esses “esforços” das empreiteiras são mínimos em comparação
com o que pode ser feito.
–
“Se não tá feliz, compre um carro!”
Uma vez um usuário da CPTM me disse isso (enquanto eu
reclamava feito uma senhora desconfortável). Eu o ignorara sem saber o quão
certo ele estava.
Entre a classe média
(que hoje é maioria da população brasileira), ter um carro é item constante na lista de
conquistas. Alguém sabe o peso da indústria automobilística na economia
brasileira?
As vendas de carros não movimentam somente o lucro de montadoras concessionárias, movimenta o setor financeiro com os financiamentos e seguros automotivos contratados, movimentam centenas de outros setores e pequenas empresas, como mecânicas, borracharias, até mesmo fabricantes de cadeirinhas - por algum motivo cadeirinhas são OBRIGATÓRIAS para transportar crianças, mas só se elas estiverem no carro, em um ônibus o assento preferencial sem cinto de segurança é mais do que suficiente - , movimenta até os lucros da própria Petrobras.
Sabemos que melhorias no transporte público, portanto, não
são interessantes e estão fora de cogitação. Se alguém dúvida que o objetivo é
simplesmente alimentar a economia que gira em torno dos carros, lembre-se que o
ex-prefeito da cidade de São Paulo – Gilberto Kassab (DEM) – chegou a proibir
até mesmo ônibus fretados na cidade no ano de 2009. Não cheguei a pesquisar a
justificativa que ele usou - mas certamente não importa, notaram que foi sem
noção.
O problema de deixar a população refém da economia são os
efeitos colaterais – não entrarei no mérito do trabalhador que produz menos por
já chegar cansado ao trabalho – como o trânsito. O Rio de Janeiro ainda
conseguiu a proeza de ter o trânsito pior do que São Paulo, mas fatos como
esses, as vezes contribuem para que as pessoas voltem ao transporte público.
O trânsito paulista forçou a prefeitura a criar as faixas
exclusivas para ônibus, desafogando assim parte tráfego – a parte dos ônibus.
Resultado: as pessoas voltaram a andar de ônibus depois de muito tempo
debandando do transporte público.
Essa experiência mostra que qualquer melhora no transporte
público contribui para sua maior utilização.
Agora imagine o melhor dos mundos: transporte público rápido,
acessível, de qualidade e funcionamento de 24 horas por dia! Esse sonho nosso
(me refiro aos usuários de transporte público) é perfeitamente possível com o
bom uso dos 40,5 milhões que as empreiteiras ganham diariamente – é claro que
tem o custo Brasil para elas, aquele de desviar o dinheiro para o governador.
O problema, caro leitor e usuário de transporte público
metropolitano, é que o nosso sonho é o pesadelo de vários setores da economia.
Estamos rendidos.
Esse autor não gosta de temas que propõem discussão e nenhuma
solução. Em casos como esse a solução não é óbvia, e qualquer que seja vai
gerar a fúria daqueles que detêm os interesses protegidos pelos nossos
governantes.
Uma solução possível envolveria uma mudança cultural extrema
e arriscada – mas que funciona em Bauru SP (estudantes pegam carona
despreocupadamente para voltar para a casa e não oferecem risco aos
motoristas).
Não imagino outra cidade onde quem tenha carro que se
arrisque a dar carona para estranhos parados em um ponto de ônibus. Nem
trabalhadores parados em um ponto de ônibus que se arriscariam a entrar no
carro de qualquer estranho oferecendo carona. Mas está ai uma campanha a se
incentivar, uma forma de manifesto e de boicote – afinal, não dá pra proibir as
caronas.
Com um numero reduzido de usuários no transporte público e de
carros circulando, a querida economia teria de encontrar outra forma de não
definhar. Limitado que sou, vejo apenas duas formas: (1) melhorando de fato o
transporte público para gerar a economia ao menos das empreiteiras; (2)
notícias de aumento de criminalidade envolvendo casos de carona.
É, agora pensando bem sobre isso... estamos rendidos.
Fontes:



País desenvolvido não é onde o pobre tem carro.
ResponderExcluirÉ onde o rico utiliza transporte público.